Para muito do que consumimos, a quantidade de escolhas possíveis cada vez é mais um fator de ansiedade ou paralisia do que de prazer.
No streaming, muitos de nós passamos mais tempo procurando o que de fato vamos assistir do que assistindo algo. Nos apps de entrega de comida, os mais indecisos estão desmaiando de fome quando finalmente a comida chega, porque ficam paralisados diante de tantas possibilidades. Nos apps de relacionamento, talvez o exemplo mais emblemático de como mais alternativas não necessariamente trazem mais realização ou o match perfeito, a frustração é tão disseminada (hello, ensh*ttification) que tem muita gente procurando outras formas de conhecer gente.
Isso que nos três casos, existem algoritmos de recomendação poderosos que são partes muito importantes do que é o produto em cada um deles, mas existe uma enormidade de contextos de compra em que não é possível usar um recurso como esse, seja uma compra muito pontual a um canal não digital controlado por terceiros.
A gente acha que quer abundância - até que o excesso de alternativas nos deixe paralisados ou constantemente insatisfeitos por acharmos que poderíamos ter feitos escolhas melhores. O Paradoxo da Escolha, escrito em 2004 por Barry Schwartz, nos explica que, por mais que autonomia e liberdade de escolha sejam críticas para nosso bem estar, ter alternativas demais é mais problema do que solução e aprofunda bastante a discussão sobre esse assunto.
Com a abundância de alternativas sendo cada vez mais regra do que exceção quando o assunto é consumo, a consequência é que o trabalho de ajudar as pessoas a escolher é uma tarefa fundamental que muitas marcas ainda subestimam. Vamos discutir alguns caminhos possíveis?
A resposta óbvia é curadoria, mas o desafio é a execução. O próprio mercado de influência digital se construiu ao redor da ideia de recomendação de alguém que parece próximo e confiável. Mas com o crescimento, os maiores influenciadores são cada vez mais relegados à posição de geradores de conhecimento de marca, porque falam com públicos amplos demais para que se crie proximidade ou identificação. Ou seja, cada vez mais parecidos com os velhos e conhecidos endossos de celebridade, que tem suas próprias limitações - alguém acredita que a Xuxa usava Monange? Alguns sugerem que o “remédio” é trabalhar com produtores de conteúdo de menor alcance para que essa proximidade e consequentemente a confiança seja possível, mas a verdade é que na maior parte dos casos as recomendações que mais contam são as das pessoas que fato nos conhecem. A legitimidade da recomendação é proporcional ao entendimento do contexto de quem a recebe.
No auge da era das marcas de venda direta (dtc), o enxugamento ou simplificação radical dos portfólios decolou como estratégia em categorias em que a dor da escolha é uma das maiores da jornada, por exemplo em colchões.
Emma, Zissou, Casper, todas têm portfólios muito mais enxutos e com descrições menos técnicas do que as marcas da velha guarda. Nos eletrônicos de consumo, a Apple ainda se destaca pela simplicidade das linhas em um mar de produtos com nomes estilo sopa de letrinhas em que é necessário ler e entender as especificações para saber como diferem.
Esse é um caminho que faz sentido especialmente em categorias em que os compradores se vêem obrigados a aprender aspectos técnicos nos quais não necessariamente tem interesse e em produtos de maior desembolso e chance de arrependimento (eletrônicos de consumo, linha branca, móveis planejados, etc.).
Nas categorias em que o processo de escolha é complicado e demorado, o boca a boca e, consequentemente a recomendação de amigos e conhecidos tem um peso ainda maior. Investir em não frustrar as expectativas de possíveis recomendadores é possivelmente um dos investimentos em comunicação mais eficazes que se pode fazer. O que nos traz para…
Se satisfação é a distância entre expectativa e realidade, nossa capacidade de balizar as expectativas antes da venda são diretamente relacionadas com como nossa entrega vai ser recebida pelo cliente.
Os japoneses são mestres nisso. Além de existir uma obrigação legal de representar os produtos de forma proporcional e verdadeira nas embalagens é muito comum que em restaurantes tenham mockups dos pratos e cardápios com fotos detalhadas, acabando com as frustrações clássicas envolvendo o tamanho da porção ou não ser o que o cliente imaginava.
A cena icônica de Michael Douglas surtando na lanchonete em “Um dia de fúria” jamais aconteceria no Japão.
Além disso, em produtos que envolvem paladar, é muito comum que sejam usados gráficos de radar com as características do sabor - tudo para quem compra saiba o que esperar.
Essa imagem viralizou no Linkedin inúmeras vezes e já é um clichê em alguns círculos, B2B e SaaS em particular - por um bom motivo.
Um dos problemas de vender o recurso e não o resultado é que a gente assume que, primeiro, o comprador entende o recurso, segundo, que se importa, e terceiro, que acredita que vai fazer diferença no resultado que ele está buscando.
Em linha com a ideia de que vender não é empurrar o produto, mas sim ajudar os interessados a comprarem, se você não sabe (de verdade) onde seu cliente quer ir, por que você quer acha que ele vai deixar sua marca guiá-lo até lá?
Sabe aquelas matrizes de recursos com diferentes planos que as empresas SaaS sempre usam na página com os preços? Elas se aplicam a muitas outras circunstâncias. Abaixo, a Western Rise, uma marca de roupas masculinas especialista em viajantes, explica as diferenças entre suas calças de um jeito que seria impossível entender só pelas fotos ou descrições individuais:
Se eu sou um cliente possível da Insider Store, como eu sei se a camiseta Tech, a Daily ou a Sportee faz mais sentido para mim, se nunca comprei e não consigo experimentar sem comprar?
Se uma dúvida ou pergunta desvia a jornada, forçando a pessoa a uma busca no YouTube, TikTok ou outro canal em que ela veja uma opinião de terceiros, a marca já perdeu o controle da narrativa e já se arrisca a ser comparada com outras - por que abrir esse espaço?
Em linhas de produtos mais amplas ou que podem competir entre si, essas comparações deveriam ser a regra, pelo menos para evitar dúvidas dentro do oferecido pela marca. Não explicar características com clareza é chance perdida de upsell e, no online, sem vendedores e com uma experiência sensorial limitada, tudo que tangibilize os aspectos físicos e sensoriais é bem vindo. Quer diminuir devoluções e trocas, subir satisfação e potencializar recomendações? Esse pode ser um caminho.
Seus clientes não são obrigados a saber avaliar qualidades técnicas (e se eles sabem, chances são de que sua marca já esteja sendo comparado diretamente com outras). Falando em atributos técnicos…
Um dos ruídos mais comuns no entendimento que as empresas tem dos humanos do lado de fora é sobreestimar tanto interesse quanto o repertório sobre categorias e marcas. Quem trabalha com tintas sabe a diferença exata entre acetinado, fosco e semi fosco e os usos ideais de cada um deles. Quem trabalha no têxtil sabe a diferença entre um french terry e um flanelado. Dá para entender - se a gente passa o dia inteiro falando do mesmo assunto, acabamos tomando nosso próprio referencial como regra.
O problema é assumir que seus possíveis compradores, potencialmente marinheiros de primeira viagem, já conhecem as tecnicalidades ou deixá-los descobrirem por um terceiro qualquer, ou pior, através de um concorrente. Ensinar pode ser parte fundamental processo de construção de confiança.
A forma com que você apresenta sua oferta hoje facilita ou atrapalha as escolhas dos seus compradores?
Na Zeitgeist, já trabalhamos com todo o tipo de produtos e serviços complexos, de medicações neurológicas à serviços B2B bastante especializados e temos bastante experiência em criar pontes entre as necessidades e expectativas das pessoas e o que a sua marca é capaz de oferecer. Tem um desafio parecido? Fale com a gente.